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  • 11/04/2025
A exposição “Arquipélago Imaginário”, em cartaz no IMS Paulista, marca os 50 anos de carreira do fotógrafo paraense Luiz Braga.
Com 250 imagens, sendo 190 inéditas, a mostra revela um olhar poético e afetivo sobre a Amazônia. O artista revisita sua trajetória desde os primeiros cliques em preto e branco até registros recentes no Marajó. A exposição segue aberta até 31 de agosto com entrada gratuita.

Reportagem: Amanda Martins e Abílio Dantas
Gravação: Karla Pinheiro (supervisão: Tarso Sarraf)
Edição: Bia Rodrigues (supervisão: Tarso Sarraf)

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Transcrição
00:00Bem, olá, seguidores do Grupo Liberal, nossos leitores, nossos espectadores.
00:05Hoje a gente vai fazer uma entrevista muito especial com o grande fotógrafo Luiz Braga,
00:11que vai lançar, no próximo sábado, vai abrir a visitação,
00:15uma das maiores exposições já vistas de um fotógrafo no país,
00:19que se chama Arquipélago Imaginário,
00:21que vai abranger várias fases da obra do Luiz Braga,
00:24que inicia no dia 12 de abril e vai até o dia 31 de agosto,
00:30no Instituto Moreira Salles, em São Paulo.
00:33Obrigado por falar com a gente, Luiz.
00:36Então, Luiz, a exposição Arquipélago Imaginário
00:40inicia a abertura a partir do próximo sábado, dia 12.
00:44Eu queria que você falasse um pouquinho de como surgiu o convite
00:47do Instituto Moreira Salles e como surgiu também a escolha desse nome,
00:52Arquipélago Imaginário.
00:54Bem, é um prazer muito grande estar aqui conversando
00:57com vocês e através de...
01:03Bom, é muito bom eu estar aqui conversando com vocês,
01:06porque a gente vai poder falar um pouco
01:08para o pessoal aí de Belém e do Pará
01:12sobre esse momento maravilhoso que eu estou vivendo.
01:16São 50 anos de carreira e ano passado eu recebi uma ligação
01:21do Marcelo Araújo, o diretor do superintendente do Instituto Moreira Salles,
01:27me propondo de celebrar os meus 50 anos de fotografia no IMS,
01:32o que me deixou muito feliz, obviamente, porque eu já respeito e conheço
01:36o trabalho que eles desenvolvem aqui há muitos anos
01:38e para mim era um sonho, de fato, mostrar o meu trabalho aqui.
01:43Então, a partir daí a gente começou uma construção.
01:47Essa construção passou pela vinda do diretor artístico do Instituto,
01:52o João Fernandes, e do curador, o Bitu Cassundé, que eu não conhecia
01:56e que foi uma das grandes aquisições desse processo todo.
02:01Eles vieram a Belém e foram comigo ao Marajó,
02:03passamos dias lá, depois dias em Belém, no meu arquivo, pesquisando.
02:09E no decorrer do processo, primeiro nós havíamos pensado,
02:15eu havia proposto o nome de constelação,
02:19porque eu enxergava, na verdade, o meu trabalho como uma grande constelação
02:23com diversos núcleos, com diversos momentos
02:27e que compunham, e de fato compõem, uma grande constelação
02:32que é, de certa forma, o meu pensamento.
02:35Só que aí se esbarrou o seguinte, o IMS tinha feito uma exposição
02:39da Clarice Lispector, que o título era Constelação.
02:42Então, por conta disso, o nome Constelação caiu.
02:45E aí eu fiquei raciocinando, pensando, conversando com o Bitu,
02:49como que a gente ia dar conta disso,
02:53já que o pensamento, a estruturação da exposição
02:56foi feita com base nesse pensamento,
02:59de que não é uma coisa única,
03:00de que são diversos núcleos, diversos momentos.
03:04Esse conceito, e aí surgiu na minha cabeça a ideia de arquipélago,
03:08que estava na minha cara, óbvio, Marajó, que vem de tanto fotografado,
03:11óbvio, estava na minha cara,
03:13muito mais a ver até do que constelação.
03:16Então, aí veio o arquipélago imaginário, na verdade,
03:19um grande conjunto de ilhas de pensamento
03:22expressados através das imagens.
03:25Então, é isso que o público vai ver aqui.
03:27São 258 obras, a maioria em preto e branco,
03:31o que vai surpreender muita gente que me reconhece e conhece pela cor,
03:36e que tem um arco de tempo que vem de 1976 até o ano passado, 2024.
03:44E que tem, por exemplo, uma das ilhas, um dos núcleos,
03:47uma das ilhas da exposição é onde eu estou aqui,
03:49que é dedicado ao Marajó.
03:51Só aqui são 50 obras.
03:53É, o que me surpreendeu muito é o fato de que das 258 fotografias,
03:59190 são inéditas, né?
04:03Nunca foram expostas.
04:06Isso, nunca, sequer eu tinha visto, Amílio,
04:09porque muitas dessas imagens que foram trazidas para a exposição
04:15estavam apenas em pequenas provas de contato,
04:19onde não dava para ver muita coisa,
04:21mas estavam guardadas, porque eu guardei tudo o que eu fiz.
04:24Então, por eu guardar e conservar também o meu material,
04:29que é um trabalho difícil,
04:30porque Belém é um dos lugares piores para conservar trabalhos em papel e filme,
04:35mas ao longo do tempo eu fui criando ferramenta por causa da umidade, exatamente.
04:40Nem é tanta temperatura, é a umidade.
04:42Então, ao longo do tempo eu fui conservando.
04:46Então, para mim, por exemplo, foi muito prazeroso ver ampliadas,
04:50pela primeira vez, obras que eu havia apertado o botão da câmera
04:55há mais de 40 anos atrás.
04:57Então, ver aquilo na minha frente ampliado foi um prazer muito grande.
05:03Ainda mais pelo seguinte,
05:04essas obras em preto e branco foram feitas no processo tradicional,
05:09no ampliador, com banho de revelação, banho de fixação,
05:14como era feito no tempo em que eu fiz as fotos.
05:18O material todo em preto e branco dessa exposição
05:21foi ampliado por uma dupla que trabalha no laboratório do IMS,
05:26o Ailton e a Tamires,
05:28que fizeram um trabalho meticuloso,
05:30dedicado e minucioso de ampliação à moda antiga,
05:34com papel fotográfico de verdade.
05:39E o outro detalhe dessa exposição, de 258 fotos,
05:44151 são em preto e branco.
05:48Isso vai surpreender muito o público,
05:50realmente surpreende,
05:51porque as pessoas que já nasceram, digamos,
05:54dos anos 2000 para cá,
05:56pessoas que têm 25 anos,
05:58talvez pensem assim,
05:59não, ele nunca trabalhou em preto e branco.
06:01Na verdade, não.
06:02O preto e branco, Abílio,
06:03ele é o alicerce da minha fotografia.
06:07A minha fotografia, ela começa e se baseia,
06:10até hoje, no preto e branco.
06:12Tanto que tem aqui na exposição
06:14uma série toda monocromática,
06:16tem um núcleo, né,
06:19que chama-se Mapa do Éden,
06:21que foi dedicado exatamente ao trabalho
06:24que eu desenvolvi em infravermelho
06:27e que é monocromático,
06:30que tem relação com o preto e branco.
06:33Então, é uma exposição surpreendente
06:36por diversos aspectos, entendeu?
06:38É a primeira vez que eu mostro o material
06:41que eu venho me dedicando no Marajó há tanto tempo.
06:46Ele tem aqui, no núcleo do Marajó,
06:48tem 50 obras em todas, em cores, entendeu?
06:52Então, é um grande prazer, sabe,
06:54na verdade, poder celebrar 50 anos de carreira
06:57vivo, com saúde e num lugar maravilhoso
07:01onde a fotografia realmente é tratada
07:06com a dignidade, o respeito e o afeto
07:10que eu sempre tive por ela.
07:12E eu acredito também que é surpreendente
07:15esse lado da tua obra, do UPB,
07:18para muita gente, né?
07:20Porque, por exemplo,
07:22eu me lembro muito da exposição
07:24Arraial da Luz,
07:25que foi feita no Espaço do Ita,
07:27aqui em Belém, né?
07:28Eu lembro que essa exposição foi muito marcante,
07:32trouxe, eu era estudante ainda,
07:34secundarista, eu lembro de algumas
07:36visitações de estudantes,
07:38e acho que foi uma exposição que marcou
07:40para muita gente.
07:42E era uma exposição que trazia
07:44essa questão da luz de forma,
07:46das cores de forma muito central, né?
07:49Então, eu queria...
07:50Sim, sim, até...
07:52Comentar, pode comentar.
07:54O Arraial da Luz foi a exposição
08:00onde eu celebrei os 30 anos de carreira,
08:04aí em Belém,
08:05e onde eu quis conectar há 20 anos,
08:10e eu conectei com o universo do meu trabalho,
08:14que tem muito a ver com a religiosidade,
08:16que tem muito a ver com as cores dos arraiais,
08:19e até por isso eu consegui fazer
08:22essa exposição,
08:23Arraial da Luz, em 2005,
08:25naquele espaço onde é o Arraial de Nazaré,
08:28que é tão querido por todos nós,
08:30que fala da infância de tanta gente,
08:33entendeu?
08:33Sim, eu lembro das fitas,
08:35foi maravilhoso.
08:36Inclusive, porque essa exposição,
08:38Arraial da Luz,
08:38que você se referiu,
08:40ela foi a exposição que eu tive
08:42o maior público em Belém,
08:44foram 35 mil pessoas.
08:46Por quê?
08:46Porque ela não tinha porta,
08:48ela não tinha blindex,
08:49ela era ao ar livre,
08:50as pessoas passavam,
08:52às vezes entravam sequer sem saber o que era,
08:54mas quando elas entravam,
08:55elas já estavam ali,
08:57percorrendo as fotografias,
08:58e melhor,
09:00muitas delas, Abílio,
09:01se encontraram com as suas imagens
09:04na exposição,
09:06entendeu?
09:07É o caso de uma mãe,
09:08que eu tenho a foto dela com as filhas,
09:11lá na Praça do Pescador,
09:14no dia de Natal,
09:15e que ela se encontrou com as fotos,
09:17depois levou as filhas para ver a foto,
09:20e também uma senhora de perfil,
09:23que chama Perfil da Senhora no Círio,
09:25que os filhos reconheceram a mãe na exposição,
09:28e eu, sem saber,
09:30havia feito o último retrato dela com vida.
09:33Depois que a exposição desmontou,
09:34eu doei a foto para a família,
09:37e essa família é querida e amiga até hoje,
09:40a Selma, que é uma das filhas,
09:41até hoje ela me segue no Instagram,
09:43comenta, a gente de vez em quando se encontra,
09:46e para mim fotografia é isso,
09:47viu, Abílio?
09:48É troca, é cumplicidade,
09:50é afeto, é respeito,
09:52por isso que para mim é fundamental
09:54que a fotografia seja feita
09:57com respeito,
10:00de forma a dignificar
10:02quem você está fotografando,
10:04de forma a apresentar
10:07faces que às vezes o povo,
10:11no corre-corre, não enxerga.
10:13Aqui nessa exposição,
10:15muita gente vai ver
10:17beleza
10:18em situações absurdamente ordinárias,
10:22e isso para mim é um grande prazer,
10:24é pegar aquela coisa ordinária,
10:26tipo um musqueteiro em cima de uma cama,
10:27como eu estou aqui,
10:28mas não dá para vocês verem,
10:29entendeu?
10:30É um pote em cima de uma mesa,
10:33é um pedaço de rede,
10:35entendeu?
10:35E isso pode,
10:37e é arte,
10:38entendeu?
10:39A arte, ela está no dia a dia,
10:41sabe?
10:42No teu caminho para o trabalho,
10:44no teu vindo da feira,
10:46indo para a farinha,
10:47entendeu?
10:48Uhum.
10:49Luiz,
10:50essa oportunidade de olhar
10:52esses 50 anos,
10:54de ter esse panorama da tua obra,
10:56o que tu identificas nesse percurso,
11:01como hoje o olhar do Luiz,
11:03o que é que mudou em relação
11:04ao teu fazer fotográfico?
11:06Tem uma fala tua no texto de divulgação,
11:10sobre a metodologia do teu trabalho,
11:12que consiste muito em visitar várias vezes
11:14o local, né,
11:16que você vai fotografar,
11:18entender aquele cotidiano,
11:21essa metodologia foi sendo desenvolvida
11:23ao longo dos anos,
11:24houve alguma modificação
11:25nesse teu fazer
11:28ao longo desses 50 anos?
11:29Fala um pouquinho disso.
11:32Olha, o que eu posso dizer, assim,
11:34em relação a essa forma de trabalhar, né,
11:38porque muitas vezes eu realmente deixo
11:40a vida me levar, né,
11:42eu sei, obviamente,
11:43onde eu possivelmente vou encontrar
11:46os objetos do meu afeto,
11:48os sujeitos que eu gosto de fotografar,
11:51eu sei mais ou menos por onde andar,
11:52mas eu não saio realmente
11:54com uma pauta marcada.
11:56No entanto,
11:57a Belém que eu transitava
11:59nos anos 70, 80, 90,
12:01ela mudou muito, né,
12:02hoje, então, infelizmente,
12:04em Belém,
12:05eu não consigo pegar a câmera
12:06e descer ali na Estrada Nova,
12:08no Júlio Luna,
12:09na Terra Firme,
12:10e sair com ela fotografando
12:11sem que as pessoas comecem
12:13a me avisar,
12:13olha, cuidado,
12:14você vai assaltar,
12:15você vai ser assaltado,
12:16olha ali,
12:17ou aí vai passar um carro na moto,
12:18vai te dar um tiro,
12:19então, isso acabou impedindo,
12:23de certa forma,
12:24que eu continuasse fotografando em Belém.
12:27E é nesse momento,
12:28mais ou menos há uns 20 anos atrás,
12:31talvez, um pouco menos,
12:32que eu comecei a intensificar
12:34as minhas idas à Ilha de Marajó,
12:36onde hoje eu consigo desenvolver
12:38essa fotografia humanista,
12:41essa fotografia onde você faz
12:43livremente o que você quer fazer,
12:46onde você acaba estabelecendo
12:48relações de amizade,
12:49como eu tenho hoje,
12:50muitas e maravilhosas
12:52relações de amizade
12:53com o povo do Marajó.
12:56Então, é simplesmente isso,
12:58ou seja,
12:59eu preciso ter paz
13:01para fotografar,
13:03eu jamais seria um fotógrafo de guerra,
13:05eu jamais seria um fotógrafo
13:07do jornalismo,
13:09do dia a dia,
13:10entendeu?
13:10Porque eu acho que eu preciso
13:11dessas idas e vindas,
13:13de você ir e voltar
13:15e você ouvir as...
13:16Hoje eu ouço muito
13:17as histórias das pessoas,
13:19sabe?
13:20Eu acho que isso acrescenta muito
13:21na minha forma de ver o mundo,
13:25ouvir as pessoas,
13:26ver como elas se sentem,
13:28como elas se percebem,
13:29como elas apresentam o seu lugar.
13:31Então, isso para mim é...
13:33Na verdade, hoje,
13:34com a maturidade,
13:36eu acho que isso foi
13:37o grande ganho que eu tive,
13:39ou seja,
13:40eu escuto muito mais
13:43do que fotógrafo.
13:47Daria, inclusive,
13:48um livro de memórias
13:49interessantes,
13:49essas tuas histórias,
13:51as histórias das fotografias.
13:54É, Abílio,
13:55eu vou fazer esse livro,
13:56eu vou fazer esse livro,
13:58eu vou fazer esse livro,
14:00essas histórias já estão todas...
14:02É, eu vou fazer esse livro,
14:06eu só preciso de agora parar,
14:08porque fazer uma exposição,
14:11por exemplo,
14:12essa exposição é uma construção
14:14de um ano, cara,
14:16um ano de seleção de imagens,
14:21de desenvolvimento de projetos
14:23espográficos.
14:25Então, mas foi uma construção
14:27extremamente brilhante
14:29e que me fez crescer também,
14:32sabe?
14:33Porque eu conheci pessoas
14:34maravilhosas,
14:36eu estabeleci reflexões
14:38sobre o que eu faço,
14:41porque, por exemplo,
14:42aqui quem vier à exposição
14:43vai ver uma cronobiografia
14:47que pega 50 anos da minha vida.
14:49Então, eu tive que voltar
14:5050 anos para ir lembrando
14:52de muitas coisas,
14:54lembrando do tempo
14:54que eu era criança,
14:55lembrando de como eu comecei
14:57a fotografar,
14:58do apoio do meu pai,
14:59da minha mãe,
15:00que foram fundamentais
15:01para que um filho de médico,
15:04ao invés de ser médico,
15:05fosse fotógrafo,
15:06sem isso criar nenhum tipo
15:07de tumulto na família,
15:09entendeu?
15:10Então, isso para mim
15:11foi um processo
15:13de amadurecimento também.
15:15Então, eu acho que agora
15:16a gente encerra um ciclo
15:17com essa celebração
15:18e eu acho que aí
15:20eu vou poder escrever
15:21esse livro, sim.
15:23Que legal!
15:24Inclusive, eu lembro recentemente
15:26nas redes sociais
15:28viralizou a tua busca
15:30de uma moça
15:31que está naquela foto
15:32que foi feita em Oteiro,
15:34se eu não me engano, né?
15:35Você estava buscando
15:37essa moça
15:38e conseguiu reencontrar.
15:40Eu a encontrei,
15:42eu a encontrei,
15:43eu fui visitar,
15:46eu a visitei
15:48em São Luís,
15:50entendeu?
15:51Eu tive o prazer
15:52de conhecê-la,
15:53almoçar na família,
15:54na casa da família
15:55e entregar a foto
15:57para ela,
15:58que era esse o meu desejo
15:59quando eu fiz essa busca.
16:01Então, isso,
16:03na verdade,
16:04ela só não havia
16:05sido encontrada antes
16:06porque ela, de fato,
16:07não morava em Belém,
16:08entendeu?
16:09Por isso que eu nunca
16:10tinha acontecido
16:12o que já aconteceu
16:12com tantas outras pessoas, né?
16:15Às vezes,
16:15eu tenho diversas histórias
16:16de pessoas,
16:17olha, esse aqui sou eu,
16:19essa aqui é o meu primo,
16:22mas muitas histórias assim,
16:24aí eu vou,
16:25entrego a foto,
16:26isso é uma coisa
16:27que eu faço
16:27há muito tempo, né?
16:29Essa coisa não começou agora
16:31com esse caso
16:31que viralizou.
16:33Sim.
16:34Isso é uma coisa
16:35que eu já faço
16:36há muito tempo,
16:36de estabelecer conexões
16:38com as pessoas,
16:39de dar a foto,
16:41de entregar,
16:42entendeu?
16:42Porque eu acho
16:42que é esse o processo
16:44para mim,
16:45entendeu?
16:45O teu trabalho
16:47tem, obviamente,
16:49essa proximidade
16:49muito grande
16:50com as pessoas,
16:51com os habitantes,
16:52com os moradores
16:53das cidades
16:54que tu fotografas, né?
16:56Hoje, a gente está,
16:57tem os preparativos
16:59da COP,
17:00e mesmo antes da COP,
17:03a Amazônia
17:03está em debate
17:04por diversos assuntos
17:06e em diversos âmbitos.
17:08Eu queria que tu falasse
17:09um pouco sobre
17:10a tua visão,
17:11que está na tua obra,
17:12que é da Amazônia,
17:13não apenas pela exuberância
17:15da natureza,
17:16da biodiversidade,
17:17mas pela vivência
17:18das pessoas.
17:19Fala um pouco
17:20sobre essa tua visão
17:21e como ela continua
17:23aí no teu trabalho.
17:27Abílio,
17:28desde o começo
17:29da minha carreira,
17:31eu bem jovem ainda,
17:32imaturo,
17:34mas eu já tinha
17:34uma intuição
17:35que hoje entendo
17:36como sincronicidade,
17:38de que o meu lugar
17:39era onde eu,
17:41de fato,
17:42nasci
17:42cresci
17:44e decidi
17:46ficar,
17:47mesmo com todas
17:48as adversidades,
17:50porque
17:50em determinado
17:52momento,
17:53fazer fotografia
17:54em Belém
17:55não era uma coisa
17:56fácil,
17:57pelas questões
17:57das ferramentas,
17:59mesmo da distância,
18:00dos pontos
18:01onde você tinha
18:02realmente
18:02a divulgação,
18:04a técnica,
18:05enfim,
18:06todas as facilidades
18:07que a pessoa tinha,
18:08por exemplo,
18:08para exercer fotografia
18:09em São Paulo,
18:11em Belém,
18:11eu tinha que viajar,
18:12para processar o material,
18:14para comprar equipamento,
18:16coisas práticas,
18:17para não falar de outras,
18:18mas coisas práticas.
18:20Espaço para fotografia,
18:21eu acho que sempre houve,
18:22Belém sempre teve
18:23um público muito especial
18:25para fotografia,
18:26para as artes em geral,
18:27para a música,
18:28para o teatro,
18:30mas o que eu penso
18:30é o seguinte,
18:31desde o começo,
18:32eu sabia que eu queria
18:33ficar onde eu estou,
18:35Belém,
18:36e que eu queria fotografar
18:38o meu lugar.
18:40No entanto,
18:41eu sempre
18:41rejeitei
18:45apresentar
18:46a Amazônia
18:47por aqueles estereótipos
18:49que você também
18:50colocou aí,
18:52que é aquela natureza
18:53exuberante,
18:55ou é o garimpo,
18:56ou são as feras
18:57nas onças,
18:59ou os indígenas,
19:00como se fosse
19:02um lugar,
19:03digamos assim,
19:04entre aspas,
19:05exótico.
19:06Eu não posso entender
19:07a Amazônia
19:08como um lugar exótico
19:09porque eu nasci nela,
19:10o meu pai,
19:11por exemplo,
19:12nasceu em Tefé,
19:13no Alto Solimões,
19:14e a minha avó paterna
19:16era indígena.
19:18Então,
19:19a ascendência dela
19:20é completamente indígena,
19:21como a do meu pai,
19:22e a minha também,
19:22embora eu não pareça,
19:23porque o outro lado
19:26da minha mãe,
19:26português,
19:27libanês,
19:28acabou falando mais alto
19:30na minha aparência.
19:31Mas eu nunca concordei
19:33em, digamos assim,
19:36reafirmar
19:37essa imagem
19:39estereotipada
19:40do nosso lugar.
19:42Eu sempre entendi
19:43que eu tinha que trabalhar
19:46o ordinário,
19:49o dia a dia,
19:50as pessoas,
19:51porque o que acontecia?
19:52O resto do Brasil,
19:54isso está, inclusive,
19:55em muitas falas minhas,
19:56isso foi aproveitado,
19:57inclusive,
19:57pelo próprio João Moreira Ságio
19:59no livro Arrabal,
20:00Onde ele cita
20:01essa conversa
20:02que eu tive com ele,
20:03que eu disse que a Amazônia,
20:05se ela tivesse,
20:07pelo resto do Brasil,
20:08mediano,
20:09povo brasileiro,
20:10tivesse pela Amazônia
20:11o mesmo pertencimento
20:13que ele tem
20:13pelo carnaval,
20:15pelo futebol,
20:17pelo samba,
20:18se o povo brasileiro,
20:21se o povo brasileiro
20:21percebesse a Amazônia
20:23como ele percebe
20:25essas coisas
20:25que eu falei agora,
20:27talvez não tivesse cometido
20:28contra ela
20:29os escalabros
20:30que a gente acabou vendo
20:31ao longo do tempo,
20:33porque talvez a opinião pública,
20:35o próprio Brasil,
20:35não fosse concordar com isso.
20:37Mas o fato é que a Amazônia,
20:39o resto do Brasil,
20:40de maneira geral,
20:41é um lugar distante,
20:42que o pessoal não conhece.
20:45Eu entro no Uber,
20:46eu falo,
20:46eu sou de Belém,
20:47aonde é Belém?
20:49É lá na Bahia?
20:51Eu falei,
20:51não, amigo,
20:52não é na Bahia,
20:53porque as pessoas
20:54não conhecem.
20:56Como é que elas vão
20:57respeitar alguma coisa
20:58que elas não conhecem?
20:59Como é que elas vão
21:00se importar
21:01com o que elas não conhecem?
21:03Entendeu?
21:04No Brasil,
21:04infelizmente,
21:05nós somos uma coisa distante.
21:07Claro que está mudando agora,
21:09a COP está mudando
21:10e está trabalhando
21:12esse jogo
21:12no sentido de mostrar
21:13nós existimos,
21:15nós fazemos música,
21:17nós fazemos cerâmica,
21:18nós fazemos uma gastronomia
21:19maravilhosa,
21:20nós temos um audiovisual
21:22fantástico,
21:22fotografia,
21:24nós temos saberes ancestrais,
21:26nós temos medicina,
21:27sabe,
21:28que vem das ervas,
21:29nós temos tanta coisa,
21:30mas ela é desconhecida,
21:31de maneira geral,
21:32ela ainda é desconhecida.
21:33Eu acho que,
21:34por exemplo,
21:34a COP está sendo feita aí
21:36pode ajudar um pouco,
21:39ou talvez muito mesmo,
21:41a mudar esse jogo.
21:42Eu espero,
21:43a minha fotografia
21:44sempre trabalhou por isso,
21:45sabe,
21:46por exemplo,
21:46as pessoas aqui
21:47chegam e falam assim,
21:48ah,
21:49mas você não nasceu lá.
21:52Não,
21:52eu nasci lá.
21:53Ah,
21:53mas então você não mora mais lá.
21:55Não,
21:55eu moro lá.
21:56Ah,
21:56mas você morou fora.
21:58Ah,
21:58não,
21:58mas você estudou fora.
21:59Nada desses estereótipos
22:01se aplica a mim,
22:02cara.
22:03Entendeu?
22:04É isso.
22:06As pessoas não esperam.
22:07Aqui entre nós,
22:08as pessoas não esperam,
22:09as pessoas me dizem,
22:11mas como que o Luiz Braga
22:12conseguiu ter essa exposição
22:14no Instituto Moreira Salles?
22:15Quem vier aqui
22:16vai ver por quê.
22:17Porque uma ocasião
22:18o jornalista me perguntou,
22:20quando eu fui para a Bienal de Veneza,
22:21ele perguntou
22:21o que eu tinha feito
22:22para ser o artista brasileiro
22:25no pavilhão em Veneza.
22:27Eu falei,
22:27ah,
22:27cara,
22:27fazer mesmo eu não fiz nada,
22:29não tinha nem galeria na época.
22:30Entendeu?
22:31Agora,
22:32eu posso te dizer
22:32que eu venho fazendo
22:33há quase 40 anos.
22:35Aí sim,
22:35talvez isso tenha chamado a atenção,
22:37como foi o caso aqui.
22:39O Marcelo Araújo,
22:40que é o superintendente
22:41do Instituto Moreira Salles,
22:43é uma pessoa que já me conhece,
22:44conhece o meu trabalho,
22:45já foi às minhas exposições.
22:47Quando ele era diretor
22:48da Pinacoteca,
22:49eu fiz exposição lá.
22:50Então,
22:51essas pessoas percebem,
22:54agora,
22:55claro que essas pessoas
22:55não são a grande maioria.
22:57Então,
22:57nesse ponto,
22:58eu acho que isso para mim
22:59é um grande presente
23:00estar mostrando o trabalho aqui,
23:02porque,
23:02obviamente,
23:03ele vai ter uma visibilidade
23:05que ele talvez nunca tenha tido.
23:06nem quando eu fui
23:07para a Bienal de Veneza,
23:08entendeu?
23:09E lá já foi
23:10uma subida bacana
23:12de degrau,
23:13entendeu?
23:13Mas aqui também vai ser,
23:15porque aqui tem um público
23:16muito grande,
23:17um público muito variado,
23:19entendeu?
23:19E isso,
23:20para mim,
23:20é muito bom,
23:21porque aqui,
23:22viu, Abílio,
23:23você vai vir aqui,
23:24eu espero que venha,
23:25ou táça disso que vem,
23:26aqui vocês vão se reconhecer,
23:28a gente que vive aí,
23:30a gente vai se reconhecer aqui.
23:34Dessa maneira,
23:35eu vou estar mostrando
23:36a gente,
23:37olha,
23:37nós somos isso,
23:39sabe?
23:40Mas não é as nossas festas,
23:42não é esse exotismo,
23:43sabe?
23:44Não é aquilo
23:45embalado
23:46para exportação,
23:48não,
23:48é o dia a dia
23:49das pessoas.
23:50É aquilo que eu te falo,
23:51é o ordinário
23:52que,
23:53através da fotografia,
23:55pode virar extraordinário
23:56e tocar o coração
23:57das pessoas.
24:00Maravilha, Luiz.
24:00Eu te agradeço muito
24:02essa entrevista
24:03e eu queria
24:03encerrar
24:04perguntando o seguinte,
24:06quando é,
24:07se existe a possibilidade
24:08da vinda
24:09dessa exposição?
24:10Tu falaste muito
24:11dessa questão
24:12da tua escolha
24:12de permanecer
24:13aqui em Belém,
24:14do Marajó,
24:16existe possibilidade
24:17da vinda
24:18da exposição
24:19para Belém
24:19ou para outros lugares
24:20do Pará?
24:21Abílio,
24:25eu tenho,
24:28antes de ter sido
24:29convidado até
24:30para fazer
24:31essa exposição aqui,
24:33eu já tinha
24:34e tenho o projeto
24:35de celebrar
24:36os meus 50 anos,
24:37aí vai ter que ser
24:3851,
24:38porque vai ser
24:39ano que vem,
24:40entendeu?
24:41Na minha terra,
24:42claro.
24:43Você que foi
24:44ao Arraial,
24:44você percebeu
24:46o quanto
24:46que é importante
24:47para mim
24:48celebrar
24:49o que eu faço
24:50no lugar
24:51onde eu escolhi viver,
24:52onde eu nasci,
24:53onde tudo
24:54o que eu faço
24:55é de onde vem,
24:57entendeu?
24:58Eu não faço
24:58fotografia para exportação,
25:00eu faço fotografia
25:00porque eu preciso,
25:02é um gesto
25:02que vem de dentro,
25:03então,
25:04para mim não tem sentido
25:05eu fazer essa exposição
25:07somente aqui,
25:08se ela vai para Belém,
25:09eu espero que ela vá,
25:11mas se ela não for,
25:11vai outra,
25:12eu vou fazer outra,
25:13com certeza no ano que vem
25:15vai ter uma exposição minha,
25:16esse ano,
25:17infelizmente,
25:17os espaços
25:18não foi possível
25:22viabilizar
25:24para fazer esse ano
25:26por conta até
25:26da própria COP,
25:27entendeu?
25:28Mas,
25:30no ano que vem
25:31a gente vai fazer
25:32uma grande exposição
25:33em Belém,
25:33se Deus quiser,
25:34e ele vai querer.
25:37Então,
25:38parabéns,
25:38sucesso,
25:39e mais uma vez
25:40muito obrigado,
25:41estamos aqui
25:41de portas abertas sempre.
25:43Não,
25:44muito obrigado,
25:45Abílio,
25:45muito obrigado,
25:46o liberal faz parte
25:48da minha história,
25:49eu sempre fui muito
25:50apoiado
25:51pelo saudoso
25:52Rômulo Maiorana,
25:54eu tive o privilégio
25:55de conhecer
25:55Pedro Pinto,
25:57entendeu?
25:58De ser colaborador
25:59do jornal,
26:00então,
26:00para mim,
26:00é muito importante
26:01estar falando com vocês,
26:02viu?
26:03Um grande abraço,
26:04e a gente se vê.
26:05tchau,
26:08tchau.
26:09Tchau,
26:09tchau.
26:12Tchau.

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